A depressão é um sintoma, e não uma doença. Pode estar relacionada com imensas situações e é assim que a devemos pensar para não estar a corrigir um sintoma, mas se possível corrigirmos a doença, a causa que motivou esse sintoma.

Desde longa data que sabemos haver uma ligação entre tiróide e depressão.

Já nas faculdades nos ensinaram que um dos sintomas de hipotiroidismo era a depressão.

Sabemos que doentes com depressão e hipotiroidismo apresentam sintomas similares: fadiga, tendência para engordar, problemas gastrointestinais, ansiedade, dores de cabeça, …

Sabemos que os sintomas depressivos podem ser muitas vezes eliminados com hormonas tiroideias. Mesmo sem doença tiroideia há quem trate a depressão com T3, a hormona activa.

Sabemos que as hormonas tiroideias podem ser dadas mesmo sem outro tratamento antidepressivo em casos de depressão.

Sabemos que as hormonas tiroideias influenciam a produção de serotonina no cérebro, actuando nos mesmos receptores de outros antidepressivos

Sabemos que a baixa da serotonina estimula a TRH (Thyroid Releasing Hormone), que por sua vez aumenta a produção de TSH (Thyroid Stimulating Hormone) e das hormonas tiroideias como mecanismo compensador, e a elevação da serotonina tem exactamente o mecanismo inverso, havendo pois uma conexão indiscutível entre humor, serotonina e hormonas tiroideias.

Assim na presença de uma depressão, há que verificar a função tiroideia, pois pode ser tratada e melhorar a depressão, escusando-nos a um tratamento que causará dependência e malefícios num futuro não longínquo ao nosso doente. As medicações anti-depressivas a longo prazo estão relacionadas com falta de memória, mais doenças neurológicas, distúrbios do sono, necessidade de medicação acessória, etc.

DEPRESSÃO COMO MANIFESTAÇÃO DE OUTRA DOENÇA

Como referi, a depressão é um sintoma, por isso há que pensar em possíveis etiologias, que devem cuidadosamente ser eliminadas, para que o tratamento seja melhor orientado. Pode haver sempre um factor genético. Pode haver uma disfunção hormonal (tiroide, menopausa, testosterona,…), muitas vezes com a idade, uma multiplicidade de disfunções, onde a correcção levará automaticamente à melhoria do sintoma depressão e humor.

Podemos ter uma deficiência de factores nutricionais como B12, folatos, B6, ferro, zinco, selénio e outros como os Omega 3 que tão conhecidamente também melhoram o sintoma depressão, pois sendo anti-inflamatórios naturais, tratam a inflamação muitas vezes associada a esta situação.

Também problemas intestinais como a disbiose intestinal, a síndrome do intestino irritável, o aumento da permeabilidade intestinal, podem estra na origem da depressão, pois é a nível intestinal que cerca de 20% da hormona tiroideia inactiva T4, se converte em hormona activa T3.

A depressão pode, pois, ser causada por uma multiplicidade de factores, que há que identificar e corrigir, antes de iniciar o utente em antidepressivos. Era bom que todos pensassem assim.

COMO TRATAR O DOENTE?

Muitas vezes identificamos um hipotiroidismo, e tratamo-lo, mas o doente continua com depressão. Em casos de depressão a terapêutica tiroideia que melhor faz a correcção da depressão é a Hormona T3, a hormona activa.

Isto porque se o utente não for capaz de converter a hormona inactiva (que produz ou lhe damos para o tratar), em hormona activa, o que acontece em cerca de 12-20% da população pela presença de um polimorfismo na enzima DIO2, não estaremos a tratar de nada e eventualmente a causar “mal” ao doente.

Assim num doente com hipotiroidismo, em que o sintoma depressão não consegue ser corrigido, há que pensar em dar directamente T3, pois as células cerebrais não estão a converter a T4 em T3.

5-10 ug de T3 farão uma diferença substancial no utente sem qualquer efeito adverso.

Infelizmente a maioria dos médicos não está habituado a manejar a T3 e não sabe, pois, corrigir este sintoma sem ser com antidepressivos, com todas as consequências negativas que poderão ter no utente a longo prazo, como já vimos.

Existem muitas situações em que o utente está medicado, não tem o polimorfismo da DIO2 e por isso converte a T4 em T3 e, no entanto, mantém o sintoma da depressão.

Temos de estar atentos a múltiplas situações que podem estar a acontecer, e que aliás estão indirectamente relacionadas com a função tiroideia, pelo que de novo chamamos a atenção para olhar e ver o doente e não as análises.

Por exemplo, lembrar que sem selénio, ferro, vitamina C e B12, zinco, não há função tiroideia boa, logo tratar a tiroide passa por tratar as deficiências nutricionais previamente. Na presença de uma anemia perniciosa por exemplo, tem de corrigir previamente a falta de B12. E não de forma oral, obviamente. Sempre injectável nesta situação.

Lembrar que pode estar a fazer tratamento com levotiroxina, T4, mas que se houver uma disfunção de órgão, como hepática, onde cerca de 60% da T4 é convertida em T3, ou intestinal, onde cerca de 20% da T4 é convertida em T3, não está a tratar convenientemente o doente. 

Daí que “tratar o intestino” é uma das premissas importantes para tratar da função tiroideia.

Lembrar de todas as interferências medicamentosas que vão levar à baixa da função tiroideia como Estatinas, opiáceos, beta bloqueantes, lítio, amiodarona (pelo conteúdo em iodo)…

Lembrar que o consumo de álcool, o stress, a falta de sono, tudo isto pode levar à baixa da função tiroideia.

Então, como eu costumo dizer, tratar tiroide não é dar um comprimido. Tratar da tiroide é tratar do intestino, da alimentação, eliminando todos os possíveis disruptores endócrinos, verificar a inter relação entre as hormonas, eliminar toxinas, corrigir o sono e então eventualmente dar um comprimido.

Devemos sempre ter a abordagem de tratar pelas “bases”: alimentação, exercício físico, suplementação nutricional, modulação hormonal (que significa tirar o melhor partido das nossas hormonas, melhorando-as naturalmente, e só se necessário suplementando-as), e estilos de vida saudáveis, antes de tratarmos de qualquer outra forma o nosso doente. Quem assim olhar para a medicina, verá que muito pouca coisa fica para ser tratada depois de corrigidos estes pilares.

Quando sabemos que a maior causa de hipotiroidismo é uma doença autoimune, a tiroidite de Hashimoto, (que na verdade na maioria das vezes conduz a um hipotiroidismo, mas às vezes a função pode estar normal ou haver mesmo um hipertiroidismo ou mesmo ser oscilante), temos de pensar na teoria de que para haver uma doença autoimune tem de haver 3 coisas: um trigger (factor desencadeante que pode ser uma infecção, EBV por exemplo, Helicobacter pylori, Bastocistis hominis, um momento de stress elevado…), aumento da permeabilidade intestinal (presença de disbiose, intestino irritável, doença inflamatória intestinal…), e a predisposição genética. E tal como um banco de 3 pernas, se cortarmos uma…ele cai.

Daí que todos devemos saber da importância da alimentação e tratamento intestinal nas doenças autoimunes, para poder facilmente compreender a depressão como sintoma de qualquer desequilíbrio corporal terá de começar a ser tratada exactamente por estas “bases”.

Podemos num Hashimoto identificar o trigger e tratá-lo, corrigir a permeabilidade intestinal, embora nada possamos fazer para a predisposição genética, mas a vitamina D controla 10% do genoma humano e tudo pode ajudar em conjunto.

Sabemos hoje que a presença dos anticorpos anti tiroideus e anti tireoglobulina presentes tantas vezes no hipotiroidismo, só por si são capazes de causar depressão. Parece haver uma reacção cruzada destes anticorpos com algumas células cerebrais, neurotransmissores, ou algo que ainda não sabemos. Já agora…também há uma relação maior do cancro da mama com a presença de anticorpos antitiroideus. Daí a importância de corrigir a alimentação eliminando o glúten, cujos anticorpos anti gliadina apresentam reactividade cruzada com componentes celulares da tiróide.

Logo pensar que a presença dos anticorpos antitiroideus não estão só a danificar a tiroide, mas também o nosso corpo em outros locais como o cérebro.

Entre as armas ao nosso alcance para reduzir os anticorpos e a depressão, temos, além do tratamento das bases e dos pilares de que já falámos, a vitamina D, a LDN, o Ashwagandha, as próprias hormonas tiroideias.

E USAR T3 ( não T4) NA DEPRESSÃO MESMO SEM DOENÇA TIROIDEIA? 

Penso que talvez seja o mais licito dadas as complicações a longo termo do uso dos SSRI (Selective Serotonin Reuptake Inhibitors), embora reconheça que alguns utentes melhoram substancialmente as suas vidas com esta medicação. Mas tentar uma pequena dose de T3 (5 a 10 ug) é lícita em algumas situações pois pode mudar a vida do doente para melhor e com muito menos riscos.

A T3 em doses terapêutica comuns, sem excesso, não causará qualquer mal, nem hipertiroidismos ou suas consequências conhecidas no excesso como arritmias cardíacas, osteoporose, imunossupressão, etc…

O doente deve ser sempre monitorizado no entanto com análises e exames e avaliação clínica regular.

Há muitos estudos onde a utilização de 50-150 ug de T3, acompanhados ao longo de dois anos não mostraram alteração a nível ósseo. Muitas vezes 5-10 ug chegam para fazer a diferença.

Com este pequeno artigo, o que eu quero é chamar a vossa atenção para o facto de que tratar uma depressão, deve começar por tratar das bases: alimentação, exercício físico, suplementação, modulação e estilos de vida saudáveis.

Tratar do hipotiroidismo uma causa frequentemente ligada à depressão é, relembro então, tratar do intestino, da alimentação, eliminar toxinas, corrigir o sono, verificar a inter-relação com as demais hormonas e então eventualmente dar um comprimido e neste caso tentar a T3.

Ivone Mirpuri